quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Livro Indicado: Nothing to Hide - The false tradeoff between Privacy and Security

Continuando os posts sobre "Livros indicados".

Livro: Nothing to Hide - The False Tradeoff Between Privacy and Security
Autor: Daniel J. Solove
Editora: YALE University Press
Edição: 1º
Data: 31/05/2011
Porque ler: Sem dúvida um dos livros mais esclarecedores que li ultimamente e coincidentemente (tá bom, nem foi tanta coincidência assim ;)) cheguei até ele pelo podcast do Segurança Legal. Já havia citado esse livro no post sobre metadados e no post sobre o fim da privacidade. Você pode inclusive ler um pedacinho do livro aqui. A ideia baseia-se em contrapor o famoso argumento do "Eu não me importo com a vigilância pois não tenho nada a esconder", e acredito que o autor atingiu seu objetivo brilhantemente. O livro trata de rebater 4 argumentos muito utilizados por quem justifica que, para termos mais segurança, precisamos abrir mão de um pouco de (ou "toda a") nossa privacidade:
  • "Devemos abrir mão da privacidade se isso nos deixa mais seguros"
  • "Se você não tem nada a esconder, não deveria se preocupar com a vigilância governamental"
  • "Devemos confiar cegamente nos oficiais da segurança (polícias em geral)"
  • "Nas emergências nacionais, alguns direitos devem ser tolhidos, mas serão restaurados posteriormente"
O livro é excelente e recomendo  a leitura.

 Link: http://www.amazon.com/Nothing-Hide-Tradeoff-between-Security/dp/0300172311
Capa do distinto:


Numa das passagens do livro, o autor que, cansado de ouvir o argumento "Se você não tem nada a esconder..." nas notícias diárias, nas discussões e entrevistas, lançou esse questionamento no seu blog e cita alguns dos seus leitores que comentaram esse argumento:
  • Minha resposta é: "E então, você tem cortinas em casa?" ou "Posso ver suas faturas de cartões de crédito deste último ano?"
  • Então, minha resposta ao argumento "Se você não tem nada a esconder..." é simplesmente "Eu não preciso justificar minha posição. Você precisa justificar a sua. Volte aqui com um mandado."
  • "Eu não tenho nada a esconder. Mas também não tenho nada que deseje lhe mostrar."
  • "Se você não tem nada a esconder, então você não tem uma vida".
  • "Me mostre o seu que eu mostro o meu".
  • "Não se trata de se tenho ou não algo a esconder, e sim sobre isso não ser da sua conta".
E nesse clima, o autor aborda diversos temas relacionados a privacidade como o fato de termos pouca privacidade em público. Será que o simples fato de estarmos na rua implica que não temos direito a nossa privacidade? Não se anseia por segredo total, mas também não se espera que tudo o que estamos fazendo esteja sendo gravado. Estudos na Inglaterra, por exemplo, onde as câmeras de vigilância dominam as ruas, mostram que seu uso não é assim tão relevante na proteção ao crime. Além do que, filmes como Watchmen já pontuaram a questão: "Quem vigiará os vigilantes"?

Pontua também sobre o que o autor chama de "O fenômeno Titanic", onde os engenheiros tinham tanta certeza de que o navio não iria afundar que sequer colocaram botes suficientes para todos e compara, inteligentemente, ao uso indiscriminado da biometria. E se der errado? Qual é o "plano B"? Senhas se trocam, e dedos? E olhos? 

O autor discute amplamente a questão da vigilância de governos sobre seus cidadãos, e apesar de ser voltado ao público americano, é muito esclarecedor ver como o processo funciona e saber que aqui também teremos essa realidade muito em breve. Talvez você não compre um livro qualquer se você teme responder nos tribunais à uma acusação de conspiração. Talvez você não visite sites sobre determinadas religiões ou visões políticas se você souber que o governo pode usar isso como uma evidência contra você e convenhamos, nenhum governo pode/deve ter esse poder sobre seus cidadãos. E ainda sobre governos utilizando tecnologias para vigilância, o autor lembra uma filosofia zen que diz: "Se uma árvore cai na floresta e não há ninguém por perto para ouvir, ela fez barulho?". Não podemos, portanto, nos iludir achando que o fato de não vermos a vigilância acontecer significar que de fato não exista. Trata-se no final das contas de uma disputa injusta entre você e o governo, dada a quantidade de recursos disponíveis, leis e órgãos regulatórios aos quais o governo utiliza/dispõe. As pessoas não devem ser sistematicamente tratadas de maneira pior do que as outras por fatores que elas não têm o poder de mudar e se um governo possui um relatório sobre mim e não tenho acesso a esse relatório, estou exatamente na situação acima referida.

Como a obra nos instiga a buscar algumas respostas, decidi fazer uma pesquisa no grupo Alcides Maya Tecnologia no Facebook (grupo ao qual faço parte e contribuo eventualmente), questionando justamente a percepção que os participantes têm sobre a privacidade. Apesar da pouca participação para um assunto tão importante (infelizmente, diga-se de passagem), os resultados são exibidos abaixo:
Pergunta 1 (os participantes do grupo tiveram prazo de 1 semana para resposta):

"Você aprova que órgãos de segurança governamentais e agências de inteligência do estado interceptem conversas telefônicas, e-mails e demais comunicações de suspeitos de pedofilia on-line, terrorismo ou demais crimes pela Internet?Resultado: Sim (36)  |  Não (8)




Pergunta 2 (os participantes do grupo tiveram prazo de 1 semana para a resposta; a pergunta foi colocada após o término do prazo para a "Pergunta 01"):

"Você aprova que órgãos de segurança governamentais e agências de inteligência do estado interceptem conversas telefônicas, e-mails e demais comunicações de suspeitos de pedofilia on-line, terrorismo ou demais crimes pela Internet, mesmo que não haja um mandado ou ordem judicial para a interceptação?"
Resultado: Sim (11)  |  Não (7) 
(como a pesquisa foi feita em momentos distintos, nem todo o público inicial pôde ser atingido ou quis participar da pesquisa)



Pelos resultados, podemos ver que a maneira como a questão é abordada, pode sim influenciar o resultado e essa "artimanha" é agressivamente utilizada pelos governos em geral para obter aprovação da opinião pública. Mesmo havendo disparidade no número de participantes das pesquisas, nota-se que na segunda, houve um aumento no porcentual de pessoas que não aprovam a interceptação, caso não haja um mandado ou ordem judicial para tanto. A ordem judicial serve justamente para evitar o abuso das autoridades policiais, caso contrário, qualquer pessoa pode ser espionada utilizando-se qualquer pretexto, mesmo que absurdo. Ainda assim a maioria, representada por 61% dos participantes aprova que, havendo mandado ou não, as comunicações possam sim ser interceptadas por governos no combate aos crimes digitais. Será que essas pessoas sabem que os agentes da NSA utilizavam o "poder de fogo" do PRISM para espionar seus cônjuges? Ou que a CIA sequestrou e torturou equivocadamente um cidadão por meses por confundir seu nome com o de um terrorista?

Enfim, concordando ou não as opiniões devem ser respeitadas. Porém acho fundamental indicar esse livro, pois ele pode abrir os olhos para muitas questões que, se não estivermos atentos, podem passar despercebidas, mas que são muito importantes para nossos direitos enquanto cidadãos e que nos dizem respeito diretamente. Trata-se de um livro muito interessante e de leitura obrigatória para quem quer saber mais sobre o "duelo" entre "Segurança x Privacidade". Recomendo.

t+

Cristiano
"A grandeza não consiste em receber honras, mas em merecê-las." - Aristóteles 

2 comentários:

Henrique Korff disse...

Acredito que os meios de vigilância já estão sendo utilizados contra o cidadão em casos de investigação criminal e esse meio foi usado na investigação do assassinato do menino Joaquim, pois a policia verificou até mesmo que sites o suspeito navegou nos dias que antecederam o crime.

Cristiano disse...

Oi Henrique. Veja bem, verificar o laptop de um suspeito por ter cometido um crime, não é bem uma vigilância e sim investigação.

O que livro indicado trata é sobre ter a sua vida vigiada 24hs, seja por meios digitais, seja por câmeras espalhadas pela cidade etc. Imagine que a sua avó te mandou uma receita de bolo e essa mensagem foi interceptada sem que você soubesse, pois órgãos policiais desconfiam que você vende bolo de maconha na frente das escolas. Para essa vigilância, precisa haver um mandado judicial, senão certamente haverão abusos. Se não tomarmos cuidado, a máxima "todos são inocentes até que se prove o contrário", vira "todos são culpados e devem ser vigiados, até que se prove o contrário" (e nunca se provará o contrário).

Abç.

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